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Tribunal de Justiça do Mato Grosso TJ-MT : 1000633-79.2021.8.11.0000 MT - Inteiro Teor
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Inteiro Teor
ESTADO DE MATO GROSSO
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
GABINETE DO DES. PAULO DA CUNHA
GABINETE DO DES. PAULO DA CUNHA
HABEAS CORPUS CRIMINAL (307) 1000633-79.2021.8.11.0000
PACIENTE: DANGELO ANTONIO MARQUES DA SILVA
IMPETRANTE: VERONICA CARVALHO RAHAL BROWN, CAROLINA FONTI, DEBORA NOBOA PIMENTEL
IMPETRADO: JUÍZO DA 10ª VARA CRIMINAL DA COMARCA DE CUIABÁ
Vistos etc.
Trata-se de habeas corpus, com pedido de liminar, imperado pela advogada Veronica Carvalho Rahal Brown e Outras, em favor de Dangelo Antônio Marques da Silva, apontando como autoridade coatora o Juízo da Décima Vara Criminal da Comarca de Cuiabá/MT.
Narram que o paciente foi denunciado como incurso nas sanções do artigo 121, §§ 3º e 4º, do Código Penal, por ter dado causa à morte de Makciley Severo de Brito, no dia 9/9/2020, cuja apuração de responsabilidade é objeto da ação penal n. 0015991-58.2020.8.11.0042, em trâmite na Décima Vara Criminal da Comarca de Cuiabá/MT.
Relatam que, após recebida a denúncia, o paciente foi devidamente citado, apresentou resposta à acusação em que se postulou (i) o reconhecimento da inépcia da denúncia; e (ii) a absolvição sumária do beneficiário, ante a atipicidade da conduta, com fundamento nos artigos3955 e3977 doCódigo de Processo Penall.
Contudo, o magistrado singular teria designado audiência de instrução e julgamento para o dia 3/2/2021 sem antes apreciar as questões deduzidas na peça defensiva.
Neste contexto, sustentam que é nula a decisão que designara audiência de instrução e julgamento, sem a prévia apreciação das teses defensivas deduzidas em resposta à acusação.
Assim, postulam a concessão de liminar para que seja suspenso o curso da ação penal de origem, cuja audiência de instrução e julgamento está designada para o dia 3/2/2021, às 14hs; e, no mérito, a anulação da decisão combatida, determinando-se que outra seja proferida, com a apreciação das teses deduzidas pela defesa na resposta à acusação.
É o essencial.
Em que pese inexista previsão legal de liminar em sede de habeas corpus, a jurisprudência tem admitido a sua concessão, sendo necessário, para tanto, manifesta necessidade e urgência. Ou seja, o constrangimento ilegal deve estar evidenciado de forma indiscutível na impetração e nos elementos probatórios contidos nos autos.
Este o caso discutido no presente remédio constitucional.
Após as inovações introduzidas no Código de Processo Penal pela Lei nº 11.719/2008, ao analisar a resposta à acusação o magistrado tem o dever de enfrentar as teses levantadas pela defesa do acusado que possam, eventualmente, conduzir ao julgamento antecipado da lide penal ou à rejeição da denúncia (arts. 395 e 397, ambos do CPP).
As questões levantadas pela defesa do paciente, em tese, poderiam impedir a deflagração da ação penal contra a sua pessoa, de modo que, não sendo apreciada, houve flagrante ofensa aos artigos 395 e 397, ambos do Código de Processo Penal.
No caso, o juiz singular simplesmente ignorou a peça defensiva apresentada, designando audiência de instrução e julgamento sem tecer uma única consideração acerca das teses deduzidas em resposta à acusação.
Ressalto que embora no momento de apresentação da resposta à acusação já houvesse, obviamente, o recebimento da denúncia, diante da arguição de inépcia da denúncia e ausência de justa causa, o juiz tem o dever de apreciar fundamentadamente as matérias e, caso se convença, rever/reapreciar as hipóteses de rejeição da denúncia previstas no art. 395 da lei procedimental penal.
Ensina Aury Lopes Júnior que “o juiz poderá desconstituir o ato de recebimento, anulando-o, para a seguir proferir uma decisão de rejeição liminar. Isso porque não existe preclusão pro iudicato, ou seja, nada impede que o juiz desconstitua seu ato e a seguir pratique aquele juridicamente mais adequado. E, mais: nada impede que o juiz, após a resposta escrita, se convença da ausência de alguma das condições da ação e rejeite a denúncia anteriormente recebida. Pela ausência de preclusão para o juiz, poderá ele, perfeitamente, realizar um novo juízo de prelibação à luz dos novos elementos trazidos, evitando assim um processo natimorto” (In, Direito Processual Penal, 9º Edição, Saraiva, São Paulo: 2012, pág. 931).
Isso decorre da interpretação da disposição contida no artigo 396-A do CPP que autoriza o acusado, na resposta à acusação, “arguir preliminares e alegar tudo o que interesse à sua defesa”. Afinal, não haveria razão para o legislador conceder ao acusado a oportunidade de arguir preliminares, se não houvesse a possibilidade de o juiz retificar um ato já praticado, ante o acolhimento de uma delas.
Assim, constatando que não houve a apreciação minimamente fundamentada das matérias deduzidas em resposta à acusação, as quais, em tese, poderiam ensejar a rejeição da denúncia ou a absolvição sumária, é evidentemente nula a decisão combatida.
Por outro lado, o sobrestamento da ação penal poderia ser mais prejudicial ao curso do feito e à razoável duração do processo que a própria solução de mérito, impondo, desde logo, a anulação da decisão combatida, para que outra seja proferida.
Assim, defiro o pedido de liminar para anular a decisão que designou audiência de instrução e julgamento sem analisar a resposta à acusação apresentada pelo paciente Dangelo Antônio Marques da Silva, nos autos da ação penal n. 0015991-58.2020.8.11.0042, determinando que o magistrado singular a aprecie, para decidir conforme entender de direito.
Intimem-se.
Solicitem-se informações.
Após, vista à Procuradoria Geral de Justiça.
Cuiabá, data da assinatura digital.
Desembargador PAULO DA CUNHA
Relator