10 de Agosto de 2022
- 2º Grau
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Detalhes da Jurisprudência
Processo
Órgão Julgador
Publicação
Julgamento
Relator
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Inteiro Teor
ESTADO DE MATO GROSSO
PODER JUDICIÁRIO
SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL
Número Único: XXXXX-89.2020.8.11.0003
Classe: APELAÇÃO CRIMINAL (417)
Assunto: [Roubo Majorado]
Relator: Des (a). FRANCISCO ALEXANDRE FERREIRA MENDES NETO
Turma Julgadora: [DES (A). FRANCISCO ALEXANDRE FERREIRA MENDES NETO, DES (A). LUIZ FERREIRA DA SILVA, DES (A). PEDRO SAKAMOTO]
Parte (s):
[DAVID ALAN PEREIRA SOUZA - CPF: 038.091.341-04 (APELANTE), TALES PASSOS DE ALMEIDA - CPF: 384.826.061-15 (ADVOGADO), MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.XXXXX/0001-57 (APELADO), PROCURADORIA GERAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MATO GROSSO (REPRESENTANTE), LEANDRO BARBOSA MACHADO - CPF: 789.978.442-53 (VÍTIMA), KLAYDSTON KAWE FELIX TEIXEIRA - CPF: 061.259.361-47 (TERCEIRO INTERESSADO), VANESSA DALL ACQUA MAGALHAES - CPF: 707.233.461-00 (TERCEIRO INTERESSADO), MARCIO REZENDE DE SOUZA - CPF: 842.857.531-20 (VÍTIMA), MARCIO REZENDE DE SOUZA - CPF: 842.857.531-20 (TERCEIRO INTERESSADO), MANOEL LAUDARIO DE BAIRROS - CPF: 978.821.600-59 (TERCEIRO INTERESSADO), PABLO RANGEL PEREIRA SANTOS (VÍTIMA), GISLAYNE MUNIZ DE OLIVEIRA - CPF: 036.219.271-58 (VÍTIMA), MARA REGINA FIGUEIRA DIAS - CPF: 041.704.041-57 (VÍTIMA), ROSILEIDE PEREIRA SOARES - CPF: 819.941.841-91 (TERCEIRO INTERESSADO), CARLOS FELICIANO DE OLIVEIRA - CPF: 405.539.301-68 (VÍTIMA), RODRIGO DE SOUZA - CPF: 012.960.901-32 (TERCEIRO INTERESSADO), SANDRA JESUS DO NASCIMENTO - CPF: 019.637.861-30 (VÍTIMA), ANA CAROLINA OLIVEIRA DA SILVA - CPF: 053.837.801-81 (VÍTIMA), MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.XXXXX/0001-57 (CUSTOS LEGIS)]
A C Ó R D Ã O
Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des (a). RUI RAMOS RIBEIRO, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO.
E M E N T A
APELAÇÃO CRIMINAL – SENTENÇA CONDENATÓRIA – ARTIGO 157, § 2º, II, E § 2º-A, I, C/C ART. 14, INCISO II, C/C ARTIGO 311, NA FORMA DO ARTIGO 69, TODOS DO CÓDIGO PENAL – APELO DEFENSIVO – RECONHECIMENTO DA INIMPUTABILIDADE OU SEMI-IMPUTABILIDADE PENAL (ART. 26, DO CP)– IMPOSSIBILIDADE – AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO – DOCUMENTOS JUNTADOS NÃO COMPROVAM A CAPACIDADE INTELECTO VOLITIVA DO AGENTE - RECURSO DESPROVIDO.
A simples prova da existência de doença mental não conduz ao reconhecimento da inimputabilidade ou semi-imputabilidade, sendo necessária a avaliação do caso concreto, para verificar a capacidade intelecto volitiva do agente. Portanto não basta a presença de enfermidade mental, mas é indispensável a prova de que a doença afetou a capacidade de compreensão do ilícito, ou de determinação segundo este entendimento, à época do fato criminoso.
R E L A T Ó R I O
Trata-se de recurso de apelação criminal interposto por David Alan Pereira de Souza contra a sentença prolatada na ação penal n. XXXXX-89.2020.8.11.0003, pelo juízo da 3ª Vara Criminal da Comarca de Rondonópolis, que o condenou pela prática do delito tipificado no art. 157, § 2º, II, e § 2º-A, I, c/c art. 14, II, c/c art. 311, na forma do art. 69 (concurso material), todos do Código Penal, à uma pena de 07 (sete) anos, 11 (onze) meses e 15 (quinze) dias de reclusão, em regime inicial fechado, e ao pagamento de 30 (trinta) dias-multa (Id. XXXXX).
Inconformado, através da Defensoria Pública interpôs recurso de apelação criminal. Nas razões recursais, requer seja aplicado o caput do artigo 26 do Código Penal e, subsidiariamente, o parágrafo único do mesmo artigo, sob argumento de que o réu não era inteiramente capaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento. (Id. XXXXX).
Em contrarrazões o Ministério Público pugna pela manutenção da sentença em todos os termos (Id. XXXXX).
Nesta instância, a douta Procuradoria Geral de Justiça, através do eminente Procurador de Justiça Jorge da Costa Lana, manifestou pelo improvimento do recurso (Id. XXXXX), sintetizando com a seguinte ementa:
“APELAÇÃO CRIMINAL – RECURSO DEFENSIVO - APELANTE CONDENADO NAS PENAS DO ARTIGO 157, § 2º, INCISOS I E II, DO CÓDIGO PENAL – ABSOLVIÇÃO POR INIMPUTABILIDADE POR DEPENDÊNCIA QUÍMICA – IMPOSSIBILIDADE – AUSÊNCIA DE LAUDO – CRITÉRIO BIOPSICOLÓGICO DE AFERIÇÃO - PELO IMPROVIMENTO DO RECURSO.””.
É o relatório.
V O T O R E L A T O R
Como visto, trata-se de recurso de apelação criminal interposto por David Alan Pereira de Souza contra a sentença prolatada na ação penal n. XXXXX-89.2020.8.11.0003, pelo juízo da 3ª Vara Criminal da Comarca de Rondonópolis, que o condenou pela prática do delito tipificado no art. 157, § 2º, II, e § 2º-A, I, c/c art. 14, II, c/c art. 311, na forma do art. 69 (concurso material), todos do Código Penal, à uma pena de 07 (sete) anos, 11 (onze) meses e 15 (quinze) dias de reclusão, em regime inicial fechado, e ao pagamento de 30 (trinta) dias-multa.
Nas razões recursais requer seja aplicado o caput do artigo 26 do Código Penal e, subsidiariamente, o parágrafo único do mesmo artigo, sob argumento de que o réu é portador de grave doença mental, e que essa circunstância teria sido desconsiderada pelo Juízo de piso. Diante disso, requer a reforma da sentença para o fim de reconhecer a inimputabilidade do réu.
Pois bem.
Analisando os autos, verifica-se que ao contrário do que alega a defesa, o juiz sentenciante analisou o pleito,
“Inicialmente consigno que, com relação ao pleito defensivo para o reconhecimento da inimputabilidade ou semi-imputabilidade do acusado, em razão dele ser portador de esquizofrenia, a meu ver, NÃO merece acolhimento, pois para a comprovação dessa patologia, é imperiosa a realização de perícia médica, através da instauração do devido incidente de insanidade mental, cujo procedimento, em momento algum foi solicitado pela defesa técnica. Ademais, sob minha ótica, a documentação acostada pela defesa na resposta à acusação, não demonstra de forma indene de dúvidas, que o réu, ao tempo da ação, era inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato, além do mais, é relevante mencionar que, conforme dispõe o art. 154, do CPP, o mencionado exame pode ser feito inclusive durante a fase de execução penal.
Neste norte, temos os seguintes julgados:
APELAÇÃO. PENAL E PROCESSUAL PENAL. ROUBO MAJORADO. USO DE ARMA DE FOGO CONCURSO MATERIAL DE CRIMES. ART. 157, § 2º, I, C/C ART. 69, DO CÓDIGO PENAL. INIMPUTABILIDADE OU SEMI-IMPUTABILIDADE, SEM A PRÉVIA INSTAURAÇÃO DE INCIDENTE DE INSANIDADE MENTAL. IMPOSSIBILIDADE. AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. 1. Apelação interposta contra sentença que condenou o recorrente pela prática das condutas tipificadas no art. 157, § 2º, I, c/c art. 69, do Código Penal à pena de 16 (dezesseis) anos de reclusão, a ser cumprida inicialmente em regime fechado, e a 60 (sessenta) dias-multa. 2. A materialidade e autoria restaram caracterizadas pelo Auto de Prisão em Flagrante Delito (fls. 02/03), Auto de Apresentação e Apreensão (fls. 07),os depoimentos das vítimas, bem como das testemunhas e termos de reconhecimento. 3. Alegação de inimputabilidade ou semi-imputabilidade requesta a prévia instauração do incidente de insanidade mental. A simples alegação de ser dependente em cocaína não prospera, vez que deve se submeter à perícia médica. Informativo nº 675, do STJ, de 14 de agosto de 2020: O reconhecimento da inimputabilidade ou semi-imputabilidade do réu depende de instauração de incidente de insanidade mental e do respectivo exame médico-legal nele previsto. 3. Razoabilidade e proporcionalidade na fixação da pena. O magistrado de primeiro grau fixou a pena-base no mínimo legal, tendo aplicado a causa de aumento da pena, igualmente, no mínimo legal previsto no art. 157, § 2º, I, c/c art. 69, do Código Penal. 4. Recurso conhecido e não provido. (TJCE; ACr XXXXX-66.2016.8.06.0001; Primeira Câmara Criminal; Rel. Des. Francisco Carneiro Lima; DJCE 20/10/2020; Pág. 203)
PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. ROUBO MAJORADO. EMPREGO DE ARMA DE FOGO. MATERIALIDADE E AUTORIA DELITIVA. COMPROVAÇÃO. ALEGAÇÃO DE SEMI-IMPUTABILIDADE. REQUERIMENTO DE INCIDENTE DE INSANIDADE MENTAL. INOCORRÊNCIA. PERÍCIA MÉDICA OFICIAL. ÉPOCA DOS FATOS. INEXISTÊNCIA. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. 1. Nos casos de semi-imputabilidade (art. 26, parágrafo único, do Código Penal), o abrandamento da sanção deve ser equivalente ao grau de capacidade do agente em entender o caráter ilícito do fato e de determinar-se de acordo com esse entendimento, conforme especificado em perícia médica. 2. A perícia realizada pelo INSS objetivou averiguar se o apelante tinha capacidade laborativa, no ano de 2014, a fim de se deferir ou não benefício assistencial, de modo que não serve para atestar sua capacidade mental reduzida para compreender o caráter ilícito dos fatos descritos na peça acusatória, quando de sua prática no ano de 2018, e de determinar-se de acordo com esse entendimento. 3. Recurso conhecido e não provido. (TJDF; APR 2018.05.1.003571-0; Ac. 119.9052; Primeira Turma Criminal; Rel. Des. Carlos Pires Soares Neto; Julg. 29/08/2019; DJDFTE 12/09/2019)
Ademais, a ação penal deve ser julgada totalmente procedente, pois vejamos:
...” (Id. XXXXX-n.n).
Conforme se verifica, ao contrário do que alega a defesa, o pedido foi devidamente analisado pelo Magistrado “a quo”, tendo sido indeferido, em razão da ausência de comprovação do alegado.
De acordo com o art. 26, caput, do Código Penal, “ é isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento ”. (sic-n.n.)
O parágrafo único preceitua que “a pena pode ser reduzida de um a dois terços, se o agente, em virtude de perturbação de saúde mental ou por desenvolvimento mental incompleto ou retardado não era inteiramente capaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento”.
Como se observa, o legislador adotou, em relação à inimputabilidade ou semi-imputabilidade, o critério biopsicológico normativo, segundo o qual, a simples prova da existência de doença mental não conduz ao reconhecimento da inimputabilidade ou semi-imputabilidade, sendo necessária a avaliação do caso concreto, para verificar a capacidade intelecto volitiva do agente. Portanto não basta a presença de enfermidade mental, mas é indispensável a prova de que a doença afetou a capacidade de compreensão do ilícito, ou de determinação segundo este entendimento, à época do fato criminoso.
O impetrante alega possuir esquizofrenia, doença mental. Entretanto os documentos juntados aos autos (prontuários médicos e atestado) não nos permite concluir pela sua inimputabilidade ou semi-imputabilidade, mas apenas demonstram que o transtorno psiquiátrico estava sob controle, não suprimindo do recorrente a capacidade intelectual ou volitiva.
E como bem pontuou a Procurador de Justiça em seu parecer, embora a defesa alegue a existência de problemas mentais em relação ao acusado, não se incumbiu de requerer a instauração de incidente de insanidade mental.
A propósito:
“RECURSO ESPECIAL. ESTUPRO. CONTRARIEDADE AO ART. 26 DO CP E NEGATIVA DE VIGÊNCIA DO ART. 149 DO CPP. ACÓRDÃO IMPUGNADO QUE RECONHECEU A CONDIÇÃO DE SEMI-IMPUTÁVEL DO RECORRIDO (ART. 26, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CP), SEM EXAME MÉDICO-LEGAL. ILEGALIDADE. IMPRESCINDIBILIDADE DO EXAME PERICIAL.
1. O art. 149 do CPP não contempla hipótese de prova legal ou tarifada, mas a interpretação sistemática das normais processuais penais que regem a matéria indica que o reconhecimento da inimputabilidade ou semi-imputabilidade do réu (art. 26, caput e parágrafo único do CP) depende da prévia instauração de incidente de insanidade mental e do respectivo exame médico-legal nele previsto, sendo possível, ao Juízo, discordar das conclusões do laudo, desde que por meio de decisão devidamente fundamentada.
2. Recurso especial provido para cassar, em parte, o acórdão exarado no julgamento da Apelação Criminal n. XXXXX - especificamente na parte que aplicou o redutor do art. 26, parágrafo único, do CP - a fim de que, verificada a dúvida acerca da sanidade mental do recorrido à época do crime, seja determinada a baixa dos autos ao Juízo de origem para realização de exame médico-legal nos termos do art. 149 do CPP.
(REsp XXXXX/RS, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, julgado em 23/06/2020, DJe 30/06/2020)”
Por todo exposto, nego provimento ao recurso de apelação interposto por David Alan Pereira de Souza, mantendo a sentença proferida em todos os termos.
É como voto.
Data da sessão: Cuiabá-MT, 06/10/2021